sábado, 29 de janeiro de 2011

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Quem cola sai da escola?

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Diz o ditado popular que ''quem não cola não sai da escola'', mas fica a indagação: quem cola aprende alguma coisa? Com a evolução da tecnologia a cola também evoluiu e mudou dos papeizinhos cuidadosamente dobrados e dos rabiscos escondidos sob as saias das garotas para os celulares e outros equipamentos eletrônicos. As trapaças ocorrem inclusive em concursos públicos e vestibulares. Os alunos hoje podem não saber a matéria, mas sabem usar o teclado dos celulares dentro dos bolsos e assim a cola se tornou eletrônica. Nos Estados Unidos a preocupação chegou a tal ponto que empresas oferecem tecnologia para analisar as folhas de respostas e identificar as que têm tantas semelhanças - em erros ou acertos - de modo que seja impossível terem sido aleatórias. O que deveria ser avaliado, no entanto, é por que os alunos recorrem à cola. Excesso de conteúdo? Metodologia de ensino inadequada? Dirce Aparecida Foletto de Moraes, mestre em Educação com foco em Avaliação da Aprendizagem, explica que o aluno cola para tirar nota e que muitas vezes os professores se preocupam com a trapaça e se esquecem da aprendizagem. ''Se o aluno chegou a uma nota, ele é aprovado ou reprovado, mas pouco se leva em consideração o processo, a aprendizagem'', critica.
Por que os alunos ainda colam? Acredito que isso aconteça porque ainda temos a avaliação muito como um caráter social e ele se reduz à nota. Se eu tiro uma nota boa, eu tenho uma premiação, sou bem-visto na sala, na sociedade, diante da minha família. Se eu tiro uma nota ruim, posso sofrer uma punição entre meus pares, na família ou diante dos professores. Outra questão que influencia na cola é o fato de ficarmos muito presos à prova. Eu defendo a  prova, sou favorável a ela, mas acho que é importante também oportunizar outras formas do aluno manifestar a aprendizagem. A forma como as avaliações são feitas induz o aluno a colar? Às vezes, a maneira como ela é levada, o seu formato, a sua organização, facilita que o aluno decore e faz com que não represente a aprendizagem. Se o aluno chegou a uma nota, ele é aprovado ou reprovado, mas pouco se leva em consideração o processo, a aprendizagem. Ensino, aprendizagem, avaliação precisam ser vistos em conjunto e não isoladamente. Na realidade brasileira temos muitos dificultadores nesse processo. O professor, falando do ensino médio, tem muitas turmas, muitos alunos, o tempo que ele passa com cada turma é muito pequeno. Tudo isso implica em vários problemas, entre eles, a prova. E muitas vezes o professor parte para provas de memorização, mais sintéticas ou de questões mais objetivas até para poder dar conta de todo o processo, porque para ele também é extenso.
Se a metodologia é voltada para ensinar o aluno a pensar, a chance dele colar depois é menor? Com certeza. É importante que a gente entenda que o processo da avaliação, ensino, aprendizagem tem que estar em consonância, porque a forma como eu ensino é a forma como eu vou avaliar. E para isso eu preciso ter objetivos muito claros, definidos. O que meu aluno tem que aprender até o fim do bimestre? É importante fazer o uso de estratégias que favoreçam esse processo. O aluno aprende através das relações que estabelece a partir daquilo que o professor traz, como atividades, textos, informações. O aluno vai se apropriando e tornando isso um conhecimento. A prova, ou outro instrumento de avaliação, vai ajudar a perceber onde ficaram as dificuldades ou não. Se eu faço uso de uma prova em que faço perguntas e respostas do tipo ''O que é, o que é?'' ou perguntas em que o aluno tenha apenas que decorar, eu facilito a cola, treino apenas a memorização e estimulo muito pouco o processo de operação mental, que deveria ser um dos papéis da avaliação. Os Estados Unidos têm muitos testes padronizados e os alunos se tornam treineiros para fazer a avaliação. Temos que ver como estamos tratando a avaliação para saber se também não estamos tornando nossos alunos treineiros. A avaliação tem que ser colaboradora do processo de ensino e aprendizagem e não um fator de punição ou promoção somente.
O excesso de conteúdo exigido pode motivar o estudante a recorrer à cola? Seria melhor se o aluno pudesse escolher quais disciplinas ele quer cursar, como ocorre em outros países? Acredito que não se deva priorizar disciplinas, mesmo no ensino médio. Talvez repensar os conteúdos. Acho que isso precisaria ser discutido porque o excesso tem sido preocupante para os professores e dificulta muito o trabalho. O tempo é curto e às vezes os alunos têm dificuldades e o professor não consegue trabalhar novamente os conteúdos. Acredito que uma reflexão em relação a priorizar conteúdos seria importante. Um experiência muito favorável que eu vivenciei no ensino fundamental foi o aumento da carga horária. É claro que talvez seja um pouco sonhador, em uma realidade como a nossa, mas um contraturno, um aumento de carga horária favoreceria muito esse processo. O professor tem muitas responsabilidades, tem que dar conta de muitos aspectos e se não tiver apoio de uma equipe, de uma gestão muito competente, ele, sozinho, não dá conta.

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